Um estudo publicado na revista Conservation Letters conclui que a determinação política, estimulada pela pressão da sociedade civil e por acordos internacionais, é decisiva para conter o desmatamento em grandes florestas tropicais. A pesquisa comparou Brasil e Indonésia, reuniu 36 especialistas e foi divulgada em 9 de setembro de 2025, em contexto próximo à COP30, marcada para Belém (PA) em 2025.
A investigação utilizou a metodologia Delphi, com rodadas anônimas de questionários e workshop virtual, para chegar ao consenso sobre os fatores que mantêm as florestas em pé e como sua importância variou nas décadas de 1990, 2000 e 2010. O grupo incluiu pesquisadores, agentes públicos e profissionais com atuação em conservação no Brasil e na Indonésia. “Nosso objetivo foi entender quais fatores colaboram para a manutenção das florestas”, afirmou Joss Lyons-White, da Universidade de Cambridge, um dos autores principais.
O recorte comparativo partiu de quedas expressivas no desmatamento registradas em períodos recentes. No Brasil, a redução foi de 84% entre 2004 e 2012; na Indonésia, de 78% entre 2016 e 2021. Segundo Júlio César dos Reis, pesquisador da Embrapa Cerrados e coautor, o trabalho “compara dois contextos distintos, Amazônia e Indonésia, identificando semelhanças, diferenças e combinações ideais de fatores de proteção florestal”.
A vontade política para cumprir as leis apareceu como fator central, mas derivada de estímulos contínuos. “Esse processo é gerado pelos constantes esforços da sociedade civil ao longo do tempo, engajamento público e pressão internacional”, disse Matthew Spencer, do The Sustainable Trade Initiative (IDH). O estudo aponta que a persistência desses vetores, e não apenas ações pontuais, sustenta os ciclos de redução do desmatamento.
No caso brasileiro, os especialistas relacionaram a queda nas taxas à combinação entre fiscalização, instrumentos legais e mudanças no padrão de expansão agropecuária. O histórico inclui incentivos estatais à conversão de florestas sobretudo entre as décadas de 1950 e 1980, e a posterior adoção de políticas como o Código Florestal e o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). Para Reis, esse conjunto mostrou que é possível reduzir a associação direta entre agricultura e desmatamento quando há fiscalização e políticas públicas ativas.
Na Indonésia, a governança florestal envolveu uma combinação mais diversa de atores e iniciativas. Políticas de “desmatamento zero” em cadeias de commodities adotadas por empresas se somaram a ações governamentais, como a moratória para novas licenças de cultivo de palma de óleo. Segundo o estudo, o país alternou processos de descentralização e recentralização, e a vontade política também foi percebida como o elemento mais relevante na década em que ocorreram as maiores quedas nas taxas.
O papel de comunidades tradicionais e povos indígenas foi apontado como componente vital, especialmente na Amazônia brasileira. O reconhecimento de direitos e territórios desde os anos 1990 ganhou importância ao longo do tempo e integrou as condições que antecederam a redução observada entre 2004 e 2012. “O reconhecimento desses direitos pelo Estado brasileiro desempenhou um papel crucial e formará uma parte vital do quebra-cabeças para conservar as florestas no futuro”, afirmou Rachael Garrett, também da Universidade de Cambridge.
Os dados demográficos recentes dimensionam o tema do bem-estar nas áreas protegidas. Segundo o Censo 2022 do IBGE, 5,82% da população brasileira, o equivalente a 11,8 milhões de pessoas, vivem em Unidades de Conservação; desse total, 282,3 mil são quilombolas e 132,8 mil são indígenas. O estudo registra que 40,34% dos domicílios nessas áreas apresentam ao menos uma categoria de precariedade, como ausência de saneamento básico. Para Judson Valentim, pesquisador da Embrapa Acre e coautor, a conservação a longo prazo depende da renda e da valorização de produtos da sociobiodiversidade: “é importante que haja renda a fim de assegurar a qualidade de vida dessas populações, guardiãs desse estoque de recursos naturais”.
As conclusões chegam às vésperas da COP30 com uma mensagem dirigida a formuladores de políticas, diplomatas e organizações sociais: reduzir o desmatamento em larga escala é possível, mas requer decisão política sustentada por vigilância social e cooperação internacional. “Profissionais e especialistas devem ter isso em mente e continuar com a luta pela conservação das florestas”, afirmou Garrett.
Fonte: Embrapa
Foto: Eufran Amaral